Flor Alves
Diretora Técnica/Fisioterapeuta da Oficina do Corpo (Olhão).
Atualmente está também a desempenhar funções como fisioterapeuta no Agrupamento de Centros de Saúde Central em Faro (ACES Central).
Trabalhou como fisioterapeuta no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão (CMRA) e no Centro de Medicina Física e de Reabilitação do Sul (CMFRS).
Experiência profissional na área de fisioterapia ortopédica, músculo-esquelética e desportiva, neurológica, oncológica, fisioterapia geral em meio aquático e pilates clínico.
Atleta amadora de trail running e no ano atual está a realizar o circuito nacional de trail longo da ATRP.
O trail running como modalidade de corrida difere da corrida de estrada principalmente pelo tipo de terreno selecionado. Os trilhos são bastante variáveis, podendo ser montanhosos, com desníveis acentuados, pisos húmidos com ribeiros ou pisos secos com pedras deslizantes e outros obstáculos como rochas, troncos e raízes. O atleta de trail running deve saber aproveitar a diversidade de movimentos, a energia muscular e a concentração momentânea, de forma a melhorar a economia do seu esforço ao longo dos desafios que vai encontrando.
Atualmente, o trail running regista um aumento do número de praticantes em todo o mundo, sendo também proporcional o aumento do número de lesões associadas.
A publicação de estudos científicos acerca desta modalidade tem aumentado, mas ainda há um longo caminho a percorrer. Sabe-se que os atletas mal preparados têm maior risco de lesões, o que vai sendo cada vez mais comum, pois aumentam o volume, a intensidade dos treinos ou as distâncias das provas sem a correta orientação profissional.
Após o início da prática da modalidade, para que haja progresso o atleta deve ter um acompanhamento específico e, se possível por uma equipa multidisciplinar, para que a evolução seja feita de forma gradual e sem lesões.
Uma das lesões mais comuns no atleta de trail running é a tendinopatia de Aquiles.
Quem nunca ouviu falar do calcanhar de Aquiles? Aquiles, até então invencível, ficou famoso por ter morrido após o seu calcanhar ter sido atingido por uma flecha envenenada, no seu único ponto fraco. A partir daí, emprestou o seu nome para uma das lesões mais comuns na corrida, a tendinopatia de Aquiles.
O tendão de Aquiles é considerado o maior e o mais forte tendão do corpo humano, conseguindo suportar até 12,5 vezes o peso corporal. Localiza-se atrás do tornozelo e liga os músculos da perna ao calcanhar. Faz a conexão entre o músculo tricípete sural (que é um conjunto de músculos da região posterior da perna, formado pelo gémeo interno, gémeo externo e solear), e o calcâneo e é usado nos movimentos de andar, correr, subir escadas, saltar e ficar em pontas dos pés.
A tendinopatia refere-se a qualquer lesão do tendão, tanto tendinite quanto tendinose. Fala-se em tendinite quando há um processo inflamatório do tendão e é reversível e em tendinose, quando há alterações crónicas degenerativas irreversíveis, com modificação na estrutura do tendão.
Existem dois tipos de tendinite do tendão de Aquiles: a tendinite não insercional (na porção média do tendão, afetando pessoas mais jovens e ativas) e a tendinite insercional (na parte inferior do osso do calcâneo, onde o tendão se insere). Em ambos os tipos de tendinite, as fibras do tendão lesionadas podem-se calcificar. Os esporões ósseos calcaneanos, geralmente estão associados à tendinite de Aquiles insercional.
A tendinopatia de Aquiles pode ocorrer em qualquer momento, não está relacionada com uma lesão específica e o problema resulta do stress repetitivo no tendão, muitas vezes por sobrecarga e mais frequentemente em corredores de longa distância e velocistas. Esta lesão geralmente acontece quando se ultrapassam os limites de resistência do corpo, mas outros fatores podem aumentar a probabilidade de desenvolver esta tendinite, como: excesso de peso; hipotrofia muscular do tricípete sural; sobrecarga do tendão por alteração repentina de treino sem a adaptação necessária (maior distância ou maior velocidade percorridas; exercícios que colocam demasiada tensão no tendão, como por exemplo, corridas explosivas ou saltos repetitivos; alteração da superfície do solo, como treino em rampas; excesso de competições); disfunção da biomecânica da corrida (pronação excessiva do pé durante o contato no solo, que aumenta a exigência sobre o tendão de Aquiles); encurtamento muscular dos músculos posteriores da perna e pouca flexibilidade do tendão de Aquiles e também o uso do calçado desportivo inadequado. A presença de esporões no local de inserção do tendão de Aquiles, pode causar atrito sobre o tendão e lesioná-lo. Com o avanço da idade a estrutura deste tendão vai enfraquecendo, aumentando também o risco de lesão.
Os sintomas comuns da tendinopatia de Aquiles incluem: dor e rigidez matinal no tendão; dor ao longo do tendão ou parte posterior do calcanhar que se exacerba com a atividade; dor severa no dia posterior ao do exercício; espessamento do tendão; esporão calcaneano (tendinite insercional); inchaço presente, que piora ao longo do dia e com a atividade e limitação no movimento de flexão. Outra situação que pode ocorrer em alguns casos é a rutura do tendão, parcial ou total, podendo ser necessário o tratamento cirúrgico.
Na maioria dos casos, as opções de tratamento são conservadoras e proporcionam alívio da sintomatologia, embora possa demorar alguns meses para que os sintomas desapareçam completamente.
A fisioterapia é muito útil quer na prevenção, quer no tratamento da tendinopatia de Aquiles e deve ser realizada em conjunto com a equipa multidisciplinar, nomeadamente, médico, treinador e preparador físico e outros profissionais envolvidos para que, em conjunto se possa equilibrar o treino e o programa de reabilitação.
O programa de fisioterapia deve também incluir uma avaliação postural e da biomecânica do movimento com o calçado desportivo adequado. Na fase aguda o foco principal deve ser na diminuição da dor e da inflamação e após o controlo devem ser incluídos exercícios e técnicas específicos para restaurar a função muscular. As atividades que implicam muita tensão sobre o tendão, como correr em plano inclinado, numa fase inicial devem ser evitadas. A corrida deve ser introduzida de forma gradual, com aumento progressivo da duração e intensidade do treino. É útil complementar a corrida com atividades de impacto reduzido, como bicicleta e exercícios em meio aquático. O treino de agilidade e sensório motor é fundamental e pode ser utilizado também como prevenção primária.
Para a concluir, apesar da tendinopatia de Aquiles ser uma das lesões mais comuns do trail running, a prevenção é possível, assim como a minimização das suas consequências quando o atleta é integrado e apoiado por uma equipa de profissionais experiente.
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