Esta semana, em vez de publicarmos um artigo sobre aspetos específicos do treino, trazemos uma reflexão sobre a realidade da indústria do Fitness que alguns praticantes desconhecem.
Nós treinadores, somos apaixonados pelo nosso trabalho e somos os primeiros a defender a nossa classe profissional e tudo o que somos capazes de dar às pessoas. No entanto, por vezes, refletir no que pode ser melhorado pode ser tão ou mais importante para dignificar o que fazemos diariamente.
Não se pretende criticar nenhum modelo, nem nenhuma marca em concreto mas sim contribuir para o debate e para que se reflita sobre estas considerações de forma a poder ajudar a melhorar e honrar uma área profissional que fazemos parte com muito orgulho.
-O Fitness diz que luta para que as pessoas se sintam bem mas por vezes não se importa assim tanto se o cliente não treina mas continua a pagar (conhecidos por “sleepers” – até têm uma denominação no universo da gestão!)
– O Fitness afirma que os respectivos clientes querem acima de tudo diversão e na tentativa de dar o que o público quer, por vezes, acaba por negligenciar a promoção da saúde e da aprendizagem;
– É o mesmo Fitness que está focado na angariação de novos clientes e na retenção dos atuais mas em alguns casos esquece-se da retenção das equipas que são a cara do serviço prestado e que podem ter o mais interventivo dos papéis na melhoria da saúde da população;
– É uma indústria que começa por definir objetivos e números mensais muito ambiciosos às suas equipas, em certas circunstâncias sem que seja dado o devido tempo para amadurecer, e, por isso, muitas vezes, acaba por ver-se obrigado a recrutar sem que a experiência seja um critério fundamental (realço que todos nós também precisámos de uma oportunidade para iniciar o que fazemos hoje, mas convém garantir o devido acompanhamento e referências para os mais novos).
– Vivemos na era dos rótulos e títulos:
Sem dúvida que é importante ter objetivos definidos e progredir na carreira. É sempre um motivo de orgulho chegarmos a CEO da empresa A; Senior Personal Trainer da empresa “B”; coordenador ou até diretor… mas talvez devêssemos não descurar sentirmo-nos com orgulho uns verdadeiros (TEF’s) técnicos de Exercício Físico promotores de saúde pública;
– Nós treinadores, passamos a vida a querer ensinar mas não dedicamos o devido tempo a aprender com quem sabe ou estuda mais que nós.
– Queremos treinar as estrelas porque queremos ser “treinadores- estrela”
– Auto-intitulamo-nos como treinadores da performance mas por vezes esquecemo-nos que as áreas da Biomecânica do Exercício, da Fisiologia Articular, Fisiologia Muscular e Sistema Nervoso podem dar as respostas necessárias e permitir adequar o treino à real condição e objetivos do atleta;
– Somos profissionais do exercício mas defendemos que os resultados se devem uma pequena percentagem ao exercício e a maior proporção a outra área que não dominamos nem estamos legalmente habilitados a trabalhar (neste caso falamos de nutrição e suplementação) ;
– Reclamamos as vitórias do cliente “X” mas esquecemo-nos que esses resultados são mais seguros e eficazes se trabalharmos em sinergia com os vários profissionais de saúde (nutricionistas, médicos, fisioterapeutas), em vez de nos intrometermos noutras áreas e blindarmos os nossos clientes/ pacientes por uma questão de “ego e controlo”;
– Lembramo-nos da importância de um trabalho multidisciplinar quando a lesão se instala nos nossos clientes/ alunos e percebemos que precisamos de trabalhar em complementariedade com os profissionais que têm outras competências;
– Utilizamos o corpo como a principal forma de promoção do nosso trabalho e acabamos por estar mais focados no nosso próprio corpo do que no corpo dos nossos clientes;
-Estamos mais atentos ao que acontece por cima da pele do que o que acontece por baixo da pele sem perceber o quão invasiva a nossa intervenção pode ser.
– Utilizamos o “soundbyte” quando divulgamos conteúdos (vídeos, artigos, posts) criando grandes expectativas que acabam defraudadas porque transmitimos ou esclarecemos muito pouco;
Estes são alguns pontos que pensamos que marcam a indústria do Fitness na actualidade e que deveriam ser reflectidos por parte dos vários intervenientes. Cabe a todos nós, treinadores, formadores e empresários, ajudar a pensar num modelo de negócio (também sustentável financeiranente, obviamente) mas que sirva da forma mais responsável e que melhor defenda todos os que procuram os espaços ou os serviços na área do exercício e saúde.
Por isso, na PTX, a formação contínua em Portugal e no estrangeiro é uma estratégia basilar do nosso crescimento. Para além disso, tentamos criar constantemente sinergias com os vários profissionais de saúde de forma a salvaguardar o mais possível a saúde de quem nos procura. Por outro lado, a produção de conteúdos que contribuam para aprendizagem, educação e sensibilização para uma forma de treino segura e centrada nas características individuais de cada cliente é também uma preocupação diária da nossa equipa. O mais simples de tudo e não menos importante, no final de cada dia, fazemos uma breve introspeção para pensar no que podemos contribuir para melhorar o serviço.
Para quem esteja a ler este texto, tal como em todas as nossas publicações, sinta-se completamente à vontade para comentar, complementar, concordar ou discordar, com intuito de fomentar o debate sobre esta temática.
Texto de Gonçalo André