Fábio Santos, 34 Anos, Licenciado em Fisioterapia. Durante a licenciatura percebeu que a sua vocação estava mais direccionada para a área Desportiva. Decidiu então investir na sua carreira na área da Fisioterapia Desportiva, mais especificamente na última década no Futebol Profissional. Começou a desempenhar funções de coordenador do departamento de Fisioterapia no Estoril Praia, Futebol SAD em 2006, tendo desempenhado essas funções até 2018. Viveu os melhores momentos desportivos do clube com duas presenças seguidas na Liga Europa: 2013/2014 e 2014/2015. Realizou inúmeras formações específicas que são uma mais valia na sua intervenção diária. É Pós-graduado em Fisioterapia Desportiva E Mestrando em Ciências da Fisioterapia. No período de 2010 a 2012 colaborou com a Escola Superior de Saúde Egas Moniz e com o Instituto Piaget de Silves como professor convidado para as valências de Fisioterapia no Desporto e Fisioterapia aplicada a condições Ortopédicas e Traumatológicas respectivamente. Ainda durante este período, decidiu apostar na Physmed – Clínica Médica e de Fisioterapia, uma Clínica de referência no concelho de cascais, direccionada para a área da medicina desportiva e fisioterapia. Actualmente trabalha na primeira liga de futebol da Arábia Saudita – Al Taawoun.
1 – Pode falar-nos sobre as principais áreas de intervenção da fisioterapia?
“De acordo com a Confederação Mundial da Fisioterapia (WCPT) a Fisioterapia é o serviço prestado por Fisioterapeutas a indivíduos e populações de forma a desenvolver, manter e restaurar o máximo movimento e capacidade funcional ao longo da vida. O fisioterapeuta, pode e deve, na minha perspectiva, realizar formação avançada para adquirir conhecimentos e competências próprias e especializadas para prestar cuidados junto de populações específicas. No meu caso, como já referi, decidi investir a minha carreira na área do Desporto, nomeadamente na área do Futebol profissional. Contudo existem inúmeras áreas importantes, tais como: Pediatria, Neurologia, Cárdio-Respiratória, entre outras.”
2 -Todos nós já sofremos lesões ou tivemos episódios de dor ao longo da vida. Quais as principais consequências de não recorrer a um fisioterapeutas atempadamente?
“Uma lesão músculo-esquelética que não seja diagnosticada atempadamente por especialistas e devidamente tratada, pode desenvolver por consequência outro tipo de problemas que podem levar a incapacidade funcional. Por exemplo, o caso mais comum do individuo que não tem uma prática desportiva regular e subitamente faz uma entorse do tornozelo. Se esta lesão não for tratada pode resultar em problemas não só a nível do mesmo tornozelo por instabilidade ou por deficit de acção dos músculos que suportam essa articulação, mas podem também ocorrer com grande frequência, queixas noutras regiões que o individuo nem associa como por exemplo a coluna lombar. Estes tipos de situações ao longo da vida provocam-nos dor. A tendência é pensar, “isto é só uma dor, depois passa”. Mas a dor é uma manifestação do nosso corpo de que algo não está bem. A desvalorização da dor, que até pode ser uma situação simples de tratar no inicio, pode a longo prazo tornar-se um problema maior e assim mais complicado para debelar. O meu conselho é nunca negligenciar uma lesão ou dor resultante de uma actividade desportiva. Deve ser avaliada, tratada e após isso trabalhar em estratégias que impeçam que volte a acontecer para que regresse a realizar actividade física. No regresso à prática desportiva o PT tem um papel fundamental na prescrição e controlo constante do treino para o sucesso dos objectivos propostos.”
3 – Trabalhar em fisioterapia desportiva e estar ligado ao futebol é o sonho de muitos profissionais. No entanto, é um mundo desafiante e muito exigente. O que o levou a seguir essa vertente?
“Desde muito novo sempre fui um apaixonado por desporto e pela competição. Em diferentes momentos realizei competição em vários desportos como o Ténis, Futebol e Futsal mas infelizmente a qualidade nunca esteve presente para prosseguir. Assim que entrei na Faculdade decidi investir na minha carreira e apostei na fisioterapia desportiva. Sempre me fascinou desde muito cedo a lesão do atleta e mais ainda como ele regressa após lesão igual ou até melhor à competição. Este desafio constante, de prevenir a lesão e de quando ocorre ter um papel importante na reabilitação da mesma é um estimulo muito desafiante e exigente, principalmente no futebol profissional em que a pressão e o desafio são diários para resultados rápidos e eficazes. Após uma lesão independentemente do tipo e grau da mesma, conseguires com que o atleta volte a desempenhar todo o gesto desportivo normal como correr, saltar, chutar etc e garantir que não volte a lesionar-se, é desafiante e envolve muito trabalho.”
4 – Considera que a preparação física é uma mais valia para os atletas na prevenção de lesões? Quais as principais preocupações e competências que um preparador físico deve reunir nesse sentido?
“Sem dúvida! Não diria só na prevenção de lesão mas na melhoria da performance desportiva do atleta. Na minha perspectiva, no inicio de uma pré-época, o preparador físico deve realizar juntamente com elementos do departamento médico uma avaliação cuidada de cada jogador. Esta avaliação permite identificar factores de risco para lesão de cada atleta. Aspectos como força muscular, flexibilidade, alterações posturais, coordenação devem ser estudados. Consoante os resultados da avaliação dos atletas devem ser programados protocolos específicos e reavaliados periodicamente. Nos últimos anos houve uma evolução enorme no controlo de carga nos treinos com o aparecimento de instrumentos, como GPS cada vez mais específicos e que permite analisar variáveis que os atletas são sujeitos durante uma unidade de treino/jogo como distancia percorrida, acelerações, distâncias intensas etc. O preparador físico hoje deve reunir competências na análise e trabalho destes dados, funcionando como uma boa ferramenta na prevenção de lesões. O preparador físico tem um papel fundamental na avaliação, prescrição de exercício e controlo do treino, nunca esquecendo as estratégias de relação comportamental preparador físico/atleta fundamentais para o sucesso da implementação de qualquer trabalho.”
5 – O treino de força está cada mais em voga no alto rendimento. Considera importante este tipo de trabalho ao longo da época tanto para os atletas que não têm limitações como para os atletas que se encontram condicionados?
“O treino de força é extremamente importante, tal como outro tipo de trabalhos específicos (flexibilidade, proprioceptividade, etc). A grande questão é a aplicação do mesmo. É importante ao desenvolver um protocolo de força ter aspectos sempre presentes, como por exemplo a especificidade do atleta consoante avaliação inicial; o tipo de trabalho de força aplicado; a frequência e quando esse estímulo é aplicado. Para atletas sem limitações é muito importante a relação directa do treino de força proposto com os objectivos programados pelo treinador para o trabalho de campo. Importante mencionar que um treino de força para o que a maioria das pessoas pensa não necessita de ser realizado especificamente no ginásio, pelo contrário também deve ser adaptado de forma funcional ao gesto desportivo no campo. No caso de atletas que vêm de lesão deve ser instituído um protocolo de retorno à competição adaptado ao mesmo.”
6 – Há cada vez mais polémica à volta do facto de muitos futebolistas recrutarem personal trainers fora dos clubes onde trabalham. Considera uma moda ou uma necessidade? Na sua opinião, isso traz mais riscos ou benefícios?
“Considero que ao longo dos anos a componente física passou a ter uma maior importância na performance desportiva. Esta importância resultou numa ambição dos atletas se sentirem cada vez mais aptos fisicamente. Contudo é importante pensar que o atleta está inserido num grupo de trabalho sujeito a uma metodologia de treino imposta pelo treinador e controlado minuciosamente em cada detalhe. Se trabalhar fora deste contexto com um PT que não tem acesso ao treino e carga aplicado durante a semana pode ser prejudicial, pois passa a ser um factor de risco para lesão. Mais do que a qualidade do trabalho implementado dentro ou fora dos clubes, a comunicação entre os diversos profissionais é fundamental. No caso de atletas em clubes de dimensões menores, com poucos recursos humanos e físicos para criar as melhores condições de treino, acredito que uma empresa de treino personalizado e performance desportiva como a PTX – Personal Training Excellence possa ser a resposta ao ter um papel importante junto dos clubes de futebol para prestar esses serviços e assim funcionar de forma integrada. Deste modo, consegue-se convergir o trabalho proposto em função da metodologia e conceitos de treino do treinador. Relembro que a Selecção Alemã campeã do mundo de futebol em 2014, recrutou serviços de uma empresa de excelência na área da performance desportiva.”
7 – Com base na sua experiência em Portugal e agora no estrangeiro, que conselhos gostaria de dar para que se articulasse o trabalho de fisioterapia desportiva e preparação física de forma a beneficiar o atleta o mais possível?
“Na minha perspectiva, um dos factores essenciais para o sucesso desportivo, é sem duvida, entre outros, a excelente articulação entre equipa técnica e o departamento médico. Os rostos mais visíveis são os do Fisioterapeuta e do Preparador Físico mas existem outros intervenientes muito importantes neste processo. O treinador principal como líder de todo o processo de actuação e como responsável máximo da metodologia de treino imposta para ir de encontro às suas ideias de jogo, deve ter ao seu lado inúmeros profissionais especializados nas mais diversas áreas com o objectivo de ter a melhor preparação e avaliação do treino possível. O médico como responsável clínico, tem evoluído muito em Portugal nos últimos anos na área da Medicina Desportiva e isso tem sido fundamental para a implementação e suporte de diversas estratégias de prevenção e promoção da performance desportiva. O objectivo passa sempre por ter todos os jogadores nas melhores condições físicas e clínicas para o treino e desta forma para o jogo. Ao longo dos anos, aliás nesta ultima década que estou inserido no futebol profissional tem havido uma evolução enorme na avaliação e preparação do treino. Hoje avalia-se diariamente parâmetros como controlo de treino do atleta e são estabelecidas através dos conceitos de relação carga aguda/carga crónica um controlo da carga de treino e consequentemente na prevenção de lesões. A qualidade do sono, percepção de dor muscular, relação do tipo de treino aplicado/suplementação a adoptar, pré-activações diárias especificas para o tipo de treino em grupo, estratégias de recuperação muscular especificas após cada treino, entre outras inúmeras estratégias. Esta análise é sempre feita em grupo e assim cada profissional actua na sua área de intervenção mais específica e a probabilidade de lesão diminui imenso. O objectivo passa por tentarmos controlar todas as variáveis que possam levar a lesão e actuarmos perante a mesma. Na prática os intervenientes mais directos com os jogadores na actuação destas estratégias são maioritariamente os Fisioterapeutas e os Preparadores Físicos, por isso só com uma comunicação e compreensão de todo o processo diário se pode chegar ao sucesso. Hoje com muito orgulho posso dizer que nos primeiros 6 meses de trabalho não tivemos qualquer jogador indisponível para um jogo oficial por lesão muscular. Este, é sem duvida, resultado de uma avaliação constante, diária e intervenção adequada de todos os elementos inerentes ao processo. ”